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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Samarco: crônica de uma tragédia anunciada

Neste momento, a lama tóxica do rompimento da barragem da Samarco arrasa com a vida de seres humanos, animais, rios e ecossistemas, em dois estados.

A empresa - cuja primeira atitude foi convocar jornalistas e advogados, para depois chamar o socorro - vai alegar inocência e culpar a natureza, contando para isso com a cumplicidade dos governantes (temerosos de perderem doações eleitorais e recursos milionários) e da mídia (cuja cobertura apelativa, sentimental, oculta as razões comerciais de seu desinteresse investigativo). Uma estratégia de encobertamento, dissimulação e vitimação que Vinicius Duarte disseca com agudeza.

Mas tal reação não oculta o fato de que se o ambientalismo fosse respeitado no país, o desastre simplesmente não teria acontecido. Pois uma barragem operava no limite, e outra a 10% deste. É a visão de que  licenças ambientais são frescura, uma mera burocracia a ser "desenrolada"  com a máxima rapidez, que leva a desastres como o de Mariana, evitáveis  se um laudo sério orientasse o licenciamento – obtido, no caso em questão, sabe-se lá como.

Porém, infelizmente, primeiro o conservadorismo tornou a ecologia um tema de chatos, e depois o petismo - Dilma à frente - o tratou como um empecilho mesquinho a atrapalhar o progresso. O resultado aí está.

Esta é uma tragédia com múltiplos autores: Fernando Henrique Cardoso (PSDB) tem a culpa pela privatização irresponsável da Vale; Aécio (PSDB) pela forma leviana como seu governo concedeu licenças ambientais; Fernando PImentel (PT), o atual governador, por continuar emitindo licenças descriteriosas e por assumir a defesa da Samarco antes de qualquer investigação; e Dilma (PT) porque foi omissa em enviar ajuda, mesmo porque preferiu usar recursos para constituir uma Força Nacional para espancar jovens que exercem seu direito constitucional à manifestação pública, em vez de constituir e enviar forças para socorrer grandes desastres.

Não há, portanto, inocentes nessa história: ela confirma, uma vez mais, que PSDB e PT são farinha do mesmo saco.

Talvez a maior lição do desastre de Mariana, a bottomline, seja que o Estado sucumbiu de vez à inciativa privada, que a privatização criou - e as relações incestuosas com políticos dos mais diversos partidos deram um poder descomunal a - megaempresas capazes de coagir governos e mídia. Esta ainda disfarça, com uma cobertura de apelo sentimental, mas no fundo pouco interessada em questionar a razão do choro dos afetados, o que demandaria investigação séria sobre as culpas e responsabilidades pela tragédia.

Já a indistinção entre interesses públicos e privados é ainda mais patente. Torna-se cristalina na inacreditável atuação de Fernando Pimentel em defesa da Samarco, um governador que tem o desplante de se dirigir ao público, em pronunciamento oficial, de dentro da sede da empresa - onde fica localizado, aliás, longe da vista da população e da imprensa, o Centro de Operação e Buscas.

O certo é que a lama tóxica de Mariana, que ora se alastra pelo Espírito Santo, é, muito provavelmente, o primeiro dos grandes desastres que a fúria desenvolvimentista e o desleixo para com a regulamentação ambiental legarão ao país. 

E que tendem a se repetir enquanto a ecologia e o ambientalismo forem considerados excentricidades e empecilhos, e não a única garantia de desenvolvimento sustentável, de continuidade da vida de pessoas, animais, rios e ecossistemas.

 

(Imagem retirada daqui)





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