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terça-feira, 1 de junho de 2010

Obama, Serra e o imperialismo

A eleição de Barack Obama à presidência dos EUA, prenhe de significações auspiciosas, trouxe, mundo afora, esperança aos setores sociais mais progressistas.

Afinal, ao mesmo tempo em que alegadamente significava o fim do imperialismo bélico da “era Bush”, culminava, com a chegada de um negro à Casa Branca, como episódio-símbolo da consumação da luta pelos Direitos Civis que teve seu auge nos anos 60.

A jovialidade do candidato, seu sorriso fácil, o otimismo contagiante do “Yes, we can” que se seguiu ao outono neoliberal, tudo parecia indicar que até um revival, em menor escala, do otimismo inebriante do pré-1968 seria possível.

Tratava-se, hoje se sabe, de uma mera ilusão. Como fica cada vez mais evidente, o acordo que, em nome da governabilidade, o presidente se viu forçado a fazer com a linha-dura do partido democrata, encarnada por Hillary Clinton – que se torna, cada vez mais, uma figura trágica, que parece ter direcionado todas as frustrações repressadas de esposa publicamente traída à acumulação de um poder tão intransigente quanto insensível - acabou por gerar não o fim dos falcões bélicos republicanos, mas tão-somente sua substituição por seus iguais democratas. (Leia no ótimo blog de Arnobio Rocha, uma reconstituição detalhada de tal processo)


O retorno do oprimido
Dois episódios, graves e recentes, parecem confirmar tal premissa. O primeiro é a reação intempestuosa dos EUA ao acordo Brasil-Irã-Turquia. Comandada pela Secretária de Estado – que, na prática, desautorizou o próprio presidente Obama -, a tratativa em prol da adoção de sanções contra o Irã, acompanhada da retórica belicista, contraria esforços em prol da paz saudados pela maioria da comunidade e da imprensa internacionais.

Foi como se o sorriso de dentes brancos e alinhados de Obama uma máscara se revelasse, dando lugar à verdadeira face da nação – a do enrugado imperialismo bélico, invasor e antidemocrático, com um desprezo pela vida humana que só rivaliza, em intensidade, com seu grau de ganância materialista.

Nem bem as pessoas de bem se recuperaram do susto ante a carranca, a brutalidade patrocinada pelos EUA uma vez mais se manifestou, na forma do inadmissível ataque do exército israelense a um comboio marítimo pacífico, que levava víveres e remédios ao campo de concentração, digo, à Faixa de Gaza. No mínimo, nove pessoas morreram.

A reação dos EUA, que sistematicamente boicotam qualquer ação contra o terrorismo de estado israelense? O de sempre: declarações afetando indignação, mas não acompanhadas do anúncio oficial da adoção de nenhuma medida para punir o prolongado banho de sangue - entre forças covardemente desiguais - no Oriente Médio.


Imperialismo brazuca
No Brasil, por sua vez, presencia-se o retorno de um discurso lumpen-imperialista que julgávamos condenado às teias de aranha da história. Vocalizado por um cada vez mais desequilibrado José Serra, apela, a um tempo, ao imaginário preconceituoso que ainda predomina, em nossa sociedade, em relação aos povos andinos e à caricaturização que nossa imprensa faz de Evo Morales – “amigo de Lula” - para culpar a Bolívia pelo tráfico de cocaína no Brasil e, de quebra, atingir a candidatura Dilma.

Se o caso fosse mesmo acusar os países vizinhos pelo tráfico no Brasil – negligenciando, como sempre, o quanto nossa própia estrutura socioeconômica colabora para tal - o candidato tucano deveria endereçar-se não ao “índio” esquerdista Morales, mas ao seu colega colombiano Álvaro Uribe, direitista e branquinho, cujo país exporta três vezes mais cocaína ao Brasil do que seu vizinho andino.

Porém, muito mais preocupante do que essa diatribe eleitoral desesperada de Serra – que subitamente deixou de ser o pós-Lula – é a soma de sua postura destrutiva em relação ao Mercosul e belicista quanto aos nossos vizinhos sul-americanos com a defesa desabrida que faz do realinhamento automático com os EUA.

Pois, no momento em que Brasil começa a se impor de forma mais visível no cenário internacional, com os avanços e retrocessos que tal condição provoca numa arena geopolítica altamente competitiva, o retorno a uma postura submissa em relação aos EUA significaria não apenas um estímulo indevido ao imperialismo desumano do qual sua história é composta, mas a renúncia a nosso direito por reafirmarmo-nos como nação livre e autônoma no cenário internacional.

3 comentários:

Eduardo disse...

Maurício,

Obama foi mesmo uma decepção, mas pelo menos as expectativas em torno do seu governo não duraram por muito tempo. Acho até que ele é o cara certo, mas na hora errada. Quanto ao Serra...

Quando o ator não é bom a interpretação não resiste por muito tempo, a mascara cai. Serra não acredita nas ideias que tentou representar e como é um pessimo ator não consegue mais convencer _ se é que alguma vez convenceu alguém. Não restou outra alternativa a não ser abandonar o papel de lulista e representar a si mesmo, um político "pequeno", de ideias pequenas. O Brasil e o mundo mudaram _ e a posição do Brasil no mundo idem _, mas José Serra não acompanhou e não entendeu essas mudanças _ e como tem um pensamento pequeno não vai acompanhar e não vai entender tão cedo.

arnobiorocha disse...

Este é um debate sobre os caminhos do Governo Obama,ou seria de Hillary?,é extremamente importante para sabermos qual a relevância política que o Brasil passa a ter no mundo. Até agora nossa diplomacia está indo muito bem, ocupando os espaços, apresentando soluções e alternativas.

É fundamental não darmos nenhum passo pra trás, estas torpe posições de Serra demonstram o quão distante do palco principal os tucanos estão. A sua posição de machão frente à Bolívia combinada à sua submissão aos EUA, torna visível que esta diplomacia não nos interessa mais.Não nos cabe mais este papel secundário de usar chicote na América Latina como um pequeno capataz do patrão do Norte.

Sigamos o debate

Unknown disse...

Eduardo,

Tive muita paciência com Obama. Agora, não mais.

Mas curioso você comentar isso do Serra, pois ontem li alguém afirmando que ele dá a impressão de ter voltado ao planeta Terra após 15 anos em Marte. Tem ideias anacrônicas. E pensar que um dia foi identificado com a esquerda...

Um abraço.



Arnobio,

É um entreguista, para utilizar um vocábulo político que a direita conseguiu estigmatizar como anacrônico, mas que se aplica ipsis litteris à triste figura.

E vem muita sujeira por aí, porque ele não aceita perder.

Um abraço.